Entrevista a Cindy
Kat: Acidente amoroso em português
Pedro
Trigueiro
Os
Cindy Kat apresentam um disco de estreia em 2006. Viagens anteriores
pelo cancioneiro pop dos anos 80 são recuperadas por Paulo Abelho
(Sétima Legião, Golpe de Estado), João Eleutério (Comboio Fantasma,
BCN) e, posteriormente, Pedro Oliveira (Sétima Legião). Cantar o amor
em português sucede a um acidental processo de composição. Uns temas
perdidos para uma peça de teatro rapidamente se transformam num álbum,
que não era de canções. O single «Polaroide» já roda nas rádios desde
Outubro de 2005.
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Cindy Kat representa um sindicato de artistas que nas
suas fileiras
dá voz de William Burroughs a Alan Ginsberg, dos Sétima Legião a JP
Simões, Zappa e Beatnicks, do teatro a «Espaço 1999», 1ª série, claro
está. Paulo Abelho e João Eleutério revelam o processo de guitarras
domadas por sintetizadores em formato de canção pop. Pelo meio, uns
quantos temas pensados para o teatro acabam num álbum de originais.
Paulo Abelho«Teve que se colocar muita coisa de
parte. Fomos
alertados por terceiros. Porque o que tínhamos nunca pensámos em
editar, fazer um disco ou surgirmos como um conceito normal de banda».
Rodrigo Leão e Ana
Carolina (mulher
do ex-Sétima Legião) registam a qualidade da matéria prima. Um
espectáculo no espaço Frágil, em Lisboa, obriga a repensar o percurso
das canções acidentais. Pedro Oliveira transforma a vida da
gata Cindy.
PA «Falámos com ele (Pedro Oliveira) para colocar
uma voz num
dos temas que gostávamos que lá estivesse. Entretanto, ele chegou ao
estúdio e disse que o tema lhe fazia lembrar o «Glória» (Sétima
Legião). De repente tínhamos uma versão do tema sem ser propriamente o
«Glória». O Pedro ouviu outras coisas que tínhamos e começou a fazer
letras para os temas. Foi aí que começámos a pensar que era necessário
pensar em termos de produção. Surgiu a Paula Homem (da Universal), que
ouviu dizer que estávamos a trabalhar numas canções, e que deu uma
força inacreditável. Depois assinámos contrato e estamos aqui a dar uma
entrevista (risos)».
As bandas nascem pelas
mais inúmeras razões. No caso dos Cindy Kat, o acidente de
estúdio resultou numa banda, que não sabia que era, baseada em canções,
que não eram canções.
PA «Nunca pensámos em influências e ir para uma sala
de ensaios.
Desse processo, foi zero. Tínhamos as músicas e criámos a banda.
Connosco só poderia acontecer assim. Se pensássemos que queríamos fazer
uma banda as coisas não teriam acontecido assim.
João Eleutério«O processo de composição das músicas
deste disco
acaba por ser variado. Não nos agarrámos a um estilo. Deu essa
liberdade. Limitamo-nos a fazer música.»
Dos temas perdidos em
computadores de
estúdio, gravados em horas impróprias e nos intervalos de outras
produções, até ao alinhamento de um disco, que necessita ponderação e
definições de tempo. Canções com hora marcada. Pedro Oliveira educa
as ideias gravadas.
PA «O Pedro foi importantíssimo. Quando o convidámos
tínhamos
música, que não eram canções. Algumas chegavam a ter sete minutos. No
fundo tínhamos um grande filme de uma viagem. Algumas ainda mantêm os
nomes, como «Space Brain» e «Missing Link». Tudo nomes retirados da
série «Espaço 1999», da 1ª série, porque a segunda já n tem piada
nenhuma. Foi um entusiasmo de várias pessoas, mesmo a parte dos amigos,
que não convidados. Passou por eles entusiasmarem-se com aquilo, sem
existir um convite formal. É um disco de emoções».
JE«Tínhamos umas músicas mais electrónicas. Quase
banda-sonora.
Numa altura pensámos em fazer outro grupo com músicas mais eléctricas e
mais canções. Mesmo sem ter voz. Pensámos que seriam para o Pedro
(Oliveira) cantar, mas nem pensamos nisto como Cindy Kat. Com ele
começamos a pensar mais no formato canção».
O Gomo em português,
via New Order.
JP Simões em toada Mão-Morta. Pedro Abrunhosa em reggae branco e a
primeira vez fora do seu âmbito. Uma nova convenção em regime
anti-hermético.
PA «A presença do Pedro Abrunhosa foi ligeiramente
diferente no
meio deste processo. Os outros todos são pessoas que passaram lá pelo
estúdio. O Abrunhosa foi devido ao que nós queríamos para a música.
Aquele ritmo mais reggae, cool, pensamos que teria uma voz mais
falada.»
O disco de estreia que
reflecte anos
de história. Aprendizagem implícita de estúdio ao escutar os artistas
de todos os dias, de quem faz do estúdio o seu local de trabalho. Paulo
Abelho e João Eleutério voltam a reunir comitiva de uma longa viagem do
cancioneiro português. PA«Somos capazes de estar a gravar
Carlos Bica assim
como no dia
a seguir estamos agravar JP Simões ou Nuno Rebelo. Assim como estamos a
misturar Mafalda Arnauth. Creio que isto é fantástico para um músico.
Porque a quantidade de informação que gerimos é imensa. Recebe-se e
manuseia-se a informação. É necessário reeinventar. Usar as fórmulas
antigas e adaptar às novas. Neste disco demos grande importância de se
cantar o amor em português. Parece que há uma certa vergonha de se
cantar o amor. Já tenho 40 anos e tenho idade para isso. Há que cantar
o amor em português.»
08-03-2006
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